Mas talvez meu ascendente seja em teimosia. E apesar da relutância em publicar isso, a vontade de falar sobre como a polarização atingiu minha pequena cria foi maior.
E sob meus estridentes protestos internos, vamos lá....
Durante o pleito fui alvejado por diversas perguntas, de todos os tipos: quem eu iria votar, por que iria votar, quais eram as propostas do meu candidato, por que tinha tantos carros com adesivos de determinado candidato, e um monte de outras.
Achei muito interessante o interesse dela em descobrir como essa tal de eleições se desenrolava. Até porque em paralelo às eleições a escola dela também fez as eleições do grêmio, onde as crianças deveriam formar chapas para concorrer, elaborar propostas e fazer campanha com os alunos! Na minha, humilde opinião, sensacional a escola fazer isso; um espelho no micro universo dele de coisas que aconteciam no macro universo.
No auge da campanha eleitoral, Manu me fez uma pergunta intrigante demais.
- Papai, se o Bolsonaro perder ele vai sabotar o Lula?
Nesse instante eu vi como a polarização daquele momento estava, também, gerando algum tipo de insegurança ou ansiedade nela, tanto quanto nos adultos.
Minha resposta nesse momento foi basicamente uma tentativa de dar um conforto democrático a ela, e também a mim.
- Não filha! Ele não pode fazer isso. Existe um processo eleitoral e democrático que tem que ser respeitado. Se por acaso o presidente Bolsonaro não ganhar ele tem a obrigação de respeitar o resultado dos votos das pessoas.
A réplica me preocupou bastante.
- Mas pai, ele é capitão! Ele pode fazer o exército sabotar o Lula...
Foi um exercício bem interessante tentar assimilar que tipo de informação chegava até ela, e como essas informações estavam sendo processadas em seu pequeno (e potente) HD interno.
- Filha, não é assim que funciona. O exército é uma instituição que é maior que presidente e que tem que garantir que a democracia e o resultado das eleições seja respeitado. Mesmo o presidente "mandando" no exército.
Claro que uma criança de 8 anos não sabe qual o peso e o valor de uma democracia, e que as informações distorcidas gere confusão nelas. Principalmente informação que de certa forma coloquem em risco algo que elas vivam mesmo sem saber o que é, como essa tal de democracia.
De alguma forma ela sentiu que o processo natural de transição de governo poderia estar ameaçado por alguém que não saberia lidar com a derrota e que teria meios (no caso o exército) de sabotar esse processo.
O efeito danoso da polarização não atinge só os adultos não....
Outro comentário que ela fez também me fez pensar o quanto a irresponsabilidade de nossos comentários surtem efeitos nas crianças que não imaginamos.
- Sabe pai, acho que eu não quero que o Lula ganhe a eleição...
- Por que, minha filha?
- TalPessoa disse que se ele ganhar, ela vai embora do Brasil. E eu não quero que TalPessoa vá embora, eu não quero ficar com saudades de TalPessoa.
Juro que a vontade era responder algo assim:
- Minha filha..... TalPessoa num vai na esquina sozinha, imagina sair do Brasil?? Mas num vai mesmo, vai ficar do jeitinho que está e só.
Mas aí eu respirei profundamente (umas 10 vezes ou mais) e procurei em mim uma resposta mais respeitosa para o medo da Manu a possibilidade de perder o convívio com TalPessoa.
- Filha, eu de verdade acho que TalPessoa não vai embora, ela tá falando assim como forma de demonstrar que não vai gostar da situação se por acaso o Lula ganhar. Até porque a gente só vai saber quem vai ganhar no dia da votação. E mesmo se o candidato que ela goste não ganhar eu duvido que TalPessoa vá realmente embora. TalPessoa tem o trabalho, tem a família, tem as coisas dela aqui. E não é tão fácil ir embora e deixar tudo assim. Não se preocupe, papai pode garantir que isso não vai acontecer, que você não vai sentir saudades de TalPessoa.
E adivinhem só? TalPessoa não foi embora do Brasil até o presente momento, e também não falou mais sobre a possibilidade de tal (óbvio!).
Se para muitos de nós esse momento do último pleito eleitoral foi duro, para as crianças não foi diferente. Pensar que criança não entende, não preocupa, não sente é diminuir a capacidade deles.
Eles entendem, sentem e se preocupam à maneira deles, e isso absolutamente não quer dizer que não seja menor que nossas percepções.
Esse papos com Manu durante o período eleitoral de 2022 me mostrou o quanto a polarização mexeu com ela e de como devemos ter responsabilidades com nossos comentários acerca desses assuntos polêmicos!
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